quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Tudo vai bem se confiamos em Deus

Texto bíblico: 2 Reis 4.1-44

Num dado momento da história de Israel, Deus escolheu agir da forma como agiu por intermédio de Elias e Eliseu para revelar-se como Deus único e Senhor a uma importante parcela de seu povo, que corria o sério risco de extraviar-se em virtude da equivocada opção religiosa de seus governantes.
Deus se revela como o Deus que age e para cujo poder não há limites. Israel precisava de provas inequívocas sobre isso. Elias e Eliseu são os profetas que não só acreditam nisso, mas se apresentam, em total consagração, para serem instrumentos do Senhor nessa empreitada. Quando aparecem homens que creem nisso e se deixam chamar, preparar e usar para a tarefa profética e nela, o milagre torna-se quase natural.

1. Azeite na panela (vv.1-7)

É possível que a viúva citada no texto seja a mulher de Obadias, o mordomo de Acabe, que havia salvado a vida de cem profetas do Senhor (1Rs 18.4). Ele “temia muito ao Senhor”, expressão presente em ambos os textos. Em suas “Antiguidades”, o historiador judeu Flávio Josefo afirma que Obadias ficara em dificuldades financeiras porque havia pegado dinheiro emprestado para sustentar essa centena de profetas. O fato é que a viúva estava na iminência de vender seus dois filhos como escravos a fim de pagar suas dívidas.
Essa drástica medida não era uma coisa rara em Israel. Embora proibida por lei (Lv 25.39-42), a escravidão era amplamente praticada entre os israelitas (Êx 21.7; Lv 25.39; Jr 34.8-16). Uma das injustiças combatidas por Neemias foi o comércio escravagista vigente em Judá na época da restauração (Ne 5.1-12).
Ao contrário de Elias, homem do deserto, Eliseu tem uma vivência bem integrada com as comunidades de profetas e das pessoas comuns. No momento, ele está lidando com um problema prático, que exige uma resposta também prática. A igreja de Cristo precisa dar respostas concretas e específicas às perguntas formuladas pelos sofredores deste mundo. É sempre tentadora a omissão que se camufla sob o manto da piedosa ajuda espiritual (Tg 2.15-16).
O milagre acontece, mas é preciso pontuar que a bênção só não foi maior porque não havia mais vasilhas para encher. Em outras palavras, o poder de Deus limita-se pelas limitações de quem pode receber seus ilimitados benefícios.

2. Um santo homem de Deus (vv.8-37)

Esta passagem é riquíssima no detalhamento narrativo e em conteúdo dramático. Começa com a amizade entre o profeta e a rica dama de Suném. Eliseu é descrito por ela como “um santo homem de Deus”. Não é ele próprio quem se autointitula dessa forma honrosa. Em nosso tempo, os pigmeus religiosos que proliferam em todo lugar chamam a si mesmos de “bispos”, “apóstolos”, “patriarcas” e “missionários”, entre outras coisas, mas o que têm a estatura de verdadeiros homens de Deus são poucos.
Eliseu é um santo homem de Deus porque tem uma vida simples e santa. Apesar de suas relações próximas e diretas com os poderosos (v.13), ele se contenta em ocupar um aposento cuja mobília é uma mesa, uma cama, uma cadeira e um candeeiro (v.10). Numa época, como a nossa, em que os falsos profetas vivem na riqueza e no luxo, um exemplo como este é uma espécie de condenação implícita a este estilo de vida mundano e exibicionista.
Eliseu é também um santo homem de Deus porque tem o espírito de gratidão (v.13) que o leva a pensar no outro e naquilo que pode ser a necessidade do outro. A mulher é estéril e seu marido é velho – um casal parecido com Sara e Abraão. O profeta intercede por eles e, no tempo aprazado, nasce-lhe um filho. A criança cresce, adoece e morre. Apesar da angústia da situação, sua mãe mantém-se calma, tomando as providências práticas para buscar socorro e aquietando o coração do marido. “Tudo vai bem”, afirma ela (v.23). Quantas pessoas, cristãos inclusive, possuem uma fé assim firme, a ponto de dizerem, mesmo diante da morte como fato consumado, que vai tudo bem?
Eliseu é também um santo homem de Deus porque o poder de Deus opera por meio dele de modo direto e instantâneo. A sunamita sabe disso, o que a leva a apegar-se ao profeta de modo inarredável, não aceitando que o socorro venha por meio de intermediários (vv.26-31). Em resposta a Geazi, ela repete o que dissera ao marido: “Vai tudo bem”.
Tudo vai bem quando um santo homem de Deus se dispõe a ajudar os angustiados (v.30). Tudo vai bem quando este homem de Deus ora ao Senhor e, além disso, executa as ações humanas que ajudarão a canalizar a resposta divina (vv.33-35). Tudo vai bem quando o poder de Deus opera, transformando a morte em vida. A Septuaginta, versão grega do Antigo Testamento, não registra os sete espirros da criança que ressuscita. Afirma que o profeta estendeu-se sete vezes sobre o menino, o que parece mais compatível com a realidade dos fatos, inclusive pela forma como o próprio Elias agiu em situação similar (1Rs 17.21).

3. Veneno na panela (vv.38-41)

Esta passagem mostra mais uma intervenção do poder de Deus por intermédio da ação profética de Eliseu. A quase tragédia do envenenamento de vários “filhos dos profetas” foi transformada na bênção de uma refeição providencial. Afastado o perigo, o momento foi também a celebração da alegria pelo duplo livramento divino, combatendo a fome e protegendo da morte.
O desespero e o açodamento de um dos aprendizes de profeta fizeram com que ele colhesse vegetais venenosos – as colocíntidas do texto – junto com ervas próprias para comer. Quando alguém provou a comida, percebeu que estava envenenada (v.40). Eliseu age então como um conhecedor do equilíbrio natural entre as várias espécies da flora local. O veneno é neutralizado pela substância contida na farinha. O milagre aconteceu, mas o profeta lançou mão de um recurso natural para facilitar sua ocorrência.
Algumas lições podem ser extraídas da experiência: a) situações-limite podem provocar erros humanos fatais. Nessas situações, a pessoa prudente age com cautela; b) assim como na vida comum se pode comer o que mata como se fosse o que sustenta a vida, na vida espiritual pode-se receber a falsa profecia ou os falsos ensinos como se fossem verdadeiros. Por isso, o conselho apostólico deve ser cumprido à risca (1Ts 5.20,21); c) a presença do mal junto com o bem (na igreja, por exemplo) num mesmo espaço não exige que se destrua a ambos, e sim que se tomem medidas que eliminem o mal.

4. Comida farta (vv.42-44)

Guardadas as proporções, não há como não relacionar o episódio aqui descrito com os milagres da multiplicação dos pães por parte de Jesus (Mt 6.30-44 e Mt 15.29-38). A fonte do milagre é a mesma – o poder de Deus manifesto pela autoridade de sua palavra. A dificuldade humana em crer na inserção do fato milagroso na dimensão da ordem natural das coisas é também a mesma: como alimentar tantos com tão pouco alimento? A segurança do servo do Senhor em dar as ordens quanto às providências para distribuir a comida é igualmente a mesma. E o resultado concreto, em termos não só do milagre efetivamente operado mas também do fato de que conseguiu-se muito mais do que o necessário, foi, de modo idêntico, o mesmo.
Se pensamos, oramos, falamos e agimos com base na autoridade da Palavra do Senhor, o milagre jamais deixará de acontecer. Pedro aprendeu isso na prática, com Jesus (Lc 5.5), mas poderia já saber desse fato conhecendo a experiência de Eliseu (v.44).

Para pensar e agir

O segredo de Eliseu, como o de Elias, é que o profeta não limitava por sua incredulidade as possibilidades de manifestação do braço do Senhor. A uma vida santa, eles adicionavam um profundo conhecimento das formas de operação do poder divino em suas conexões com a palavra revelada. A palavra do Senhor estava com os profetas. Eles a conheciam, sabendo como manejá-la. No momento em que ela se manifestava, o milagre era a consequência automática.

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